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sábado, 2 de junho de 2007

DALLARI: “SERRA AVANÇOU, MAS AINDA HÁ RISCO”

31/05/2007 18:37h
http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/435001-435500/435244/435244_1.html

O jurista Dalmo Dallari disse em entrevista a Paulo Henrique Amorim nesta quinta-feira, dia 31, que a edição dos decretos do Governador José Serra é um avanço, mas “ainda há risco para a autonomia das universidades” (clique aqui para ouvir o áudio).

Dallari disse que ainda existe o risco de o Governador tirar a autonomia financeira das universidades. “Eu acho que ainda existe, pelo menos não ficou claro na primeira leitura dos decretos”, disse Dallari.

Segundo Dallari, “é preciso melhorar as técnicas dos decretos porque... a leitura exige uma biblioteca”.

Dallari disse que, mesmo com o novo texto dos decretos, a Secretaria de Ensino Superior continua inconstitucional. “Porque houve o artifício de fazer de conta que só se estava mudando o nome de uma secretaria. Então a Secretaria de Turismo passa a se chamar Secretaria de Ensino Superior”, disse Dallari.

Segundo Dalmo Dallari, a Secretaria de Turismo não poderia ser extinta por decreto porque foi criada por lei. Ele disse que o artifício de mudar o nome não pode ser aceito porque, na verdade, muda completamente o objetivo da secretaria.

“E também, o ponto, que para mim é fundamental, a Secretaria de Turismo foi criada com órgãos próprios para o Turismo. O seu funcionalismo foi concursado, foi contratado tendo em vista pessoas especializadas em turismo. Como essas pessoas vão agir para a educação superior?”, questiona Dallari.

Leia abaixo a íntegra da entrevista com Dalmo Dallari:

Paulo Henrique Amorim – Eu vou conversar agora com o professor Dalmo Dallari. Professor Dallari, o senhor vai bem?

Dalmo Dallari – Tudo bem, graças a Deus, obrigado.

Paulo Henrique Amorim – Professor, o senhor leu os novos decretos baixados hoje pelo governador José Serra?

Dalmo Dallari – Eu li. Não fiz o exame mais minucioso, mais aprofundado porque não houve tempo, mas eu dei uma lida já, fiz uma primeira leitura e acho que foi bom.

Paulo Henrique Amorim – Foi bom?

Dalmo Dallari – Foi bom. Eu acho que alguns pontos básicos foram corrigidos e acho também, um dado positivo, é que o governador tenha tomado essa iniciativa, tenha aceitado isso de rever os seus próprios atos.

Paulo Henrique Amorim – Eu pergunto, os reitores vão poder usar os recursos, as verbas com a autonomia de antes?

Dalmo Dallari – Pois é, esse é um ponto que ainda não ficou claro. O que ficou claro no decreto foi que as restrições a contratação não se aplicam à universidade. E depois existe uma disposição a respeito da parte financeira que parcialmente libera as universidades das restrições impostas ao restante da administração. Agora, será necessário um exame mais aprofundado para saber, por exemplo, se a universidade não fica sujeita aos remanejamentos de verba e, uma outra coisa que tem sido muito grave, e é aquilo que antigamente nós chamávamos de congelamento. Agora ficou moderno falar em contingenciar. E no fim é a mesma coisa, é impedir de gastar o dinheiro. E este ano mesmo houve contingenciamento de verbas da universidade e eu não vi isso mencionado no decreto. De maneira que isso pode, eventualmente, decorrer por via indireta, mas não está claro.

Paulo Henrique Amorim – Sei, quer dizer que então o risco de o governador tirar a autonomia financeira das universidades ainda existe?

Dalmo Dallari – Ainda existe. Pelo menos não ficou claro na primeira leitura nos decretos. Aliás, é uma observação que eu faria: é preciso melhorar a técnica dos decretos, porque eles fazem muita referência a uma lei, a um decreto, ao artigo tal, a cláusula não sei o que... a leitura exige uma biblioteca quase.

Paulo Henrique Amorim – Não será de propósito?

Dalmo Dallari – Acho que de certo modo é para obscurecer.

Paulo Henrique Amorim – Outra pergunta, professor, com esses novos decretos quase inteligíveis.

Dalmo Dallari – Eu acho que a secretaria continua inconstitucional.

Paulo Henrique Amorim – Inconstitucional.

Dalmo Dallari – Inconstitucional porque houve o artifício de fazer de conta que só estava mudando o nome de uma secretaria. Então, Secretaria de Turismo passa a se chamar de Ensino Superior. Mas a Secretaria de Turismo foi criada por lei. Já esse é um primeiro ponto: ela não pode ser extinta por decreto. E aí eles: “Nós não estamos extinguindo, estamos mudando o nome”. Mudando completamente os objetivos, não é? E também um ponto que é fundamental: a Secretaria de Turismo foi criada com órgãos próprios para o turismo, o seu funcionalismo foi concursado, foi contratado tendo terem vista pessoas especializadas em turismo. Como é que essas pessoas vão agir para a educação superior? Então, de fato isso não foi saneado não.

Paulo Henrique Amorim – Quer dizer que o que era antes Secretaria de Ensino Superior leia-se agora Secretaria de Turismo?

Dalmo Dallari – Não, ao contrário. O que era Turismo leia-se agora Ensino Superior.

Paulo Henrique Amorim – Quer dizer, quem entendia de...

Dalmo Dallari – Quem entendia de surf e de hotéis e de tudo isto vai entender de ensino superior.

Paulo Henrique Amorim – Fim de semana, camping...

Dalmo Dallari – Pois é. Mas é óbvio que isto é ilógico.

Paulo Henrique Amorim – Claro, claro. Então eu pergunto: diante dessas suas ainda perplexidades o senhor continua com a idéia de entrar com aquela Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade)?

Dalmo Dallari – Eu tenho notícia de que na Assembléia Legislativa está sendo montada uma ação. Então, é por lá, porque, pela Constituição, a Adin não é ação que possa ser proposta por um cidadão, tem que ser proposta por uma entidade, uma associação nacional, um partido político. Então, esse é o caminho que hoje tive notícia que vai ser tomado por deputados.

Paulo Henrique Amorim – Entendo. Então quer dizer que se os estudantes voltarem a lhe pedir esclarecimentos sobre a natureza efetiva desses decretos novos do governador Serra, o senhor dirá que ainda tem dúvidas?

Dalmo Dallari – Eu direi isso: que houve um avanço, sem dúvida alguma e também um gesto de boa vontade do governador. Eu acho muito perigoso, inadequado, dizer que houve vencedores e perdedores, não existe isto. Houve de fato então, se quiser dizer, um avanço no sentido de proteger mais a autonomia da universidade. Então, é muito importante que prossigam os entendimentos. E que o governador e os reitores sejam mais abertos ao diálogo.

Paulo Henrique Amorim – Porque os reitores não tem sido?

Dalmo Dallari – Não, não têm sido. Infelizmente, não. Esse aliás, a meu ver, foi um dos motivos de se ter chegado a uma situação tão grave. Especialmente no caso de São Paulo. Se a reitora tivesse recebido os estudantes, conversado com eles, eu acho que talvez até se tivesse impedido, evitado essa decisão tão drástica.

Paulo Henrique Amorim – Professor, é sempre um prazer falar com o senhor. Muito obrigado.

Dalmo Dallari – Estou sempre a suas ordens com imenso prazer. Boa noite e um abraço.