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domingo, 24 de junho de 2007

O melhor produto do Brasil é a gestão da pobreza, diz filósofo

Folha de SP, 24 de junho de 2007.
 

DO COORDENADOR DE ARTIGOS E EVENTOS

O melhor produto do Brasil é a gestão da pobreza. E a atuação do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), na área da educação sugere que ele está correndo atrás de um dos achados de Luiz Inácio Lula da Silva (PT): o ProUni, a política de inclusão social por meio de bolsas universitárias.
Ao discutir o papel que o governo Lula tem no cenário de irrelevância da política, o filósofo Paulo Arantes e os sociólogos Francisco de Oliveira e Laymert Garcia dos Santos afirmam que o êxito da política educacional do governo federal é apenas aparente e opera numa lógica perversa, pois conquista amplo apoio social e praticamente anula a possibilidade de oposição, mas não leva o país a lugar nenhum.
"O ProUni é um achado. Estamos no "best practice" de políticas públicas para países emergentes sem solução, que têm populações eternamente pobres que têm de ser administradas. É um negócio que poderia ser vendido no mundo inteiro pelo Banco Mundial: como gerir 200 milhões de pessoas sem conflito", afirma Arantes.
A perversidade do ProUni, segundo os três, está no fato de que ele conquista pelo sonho de vida da maior parte dos jovens pobres, que é o ensino superior. Ou seja, é difícil ser contra.
Na outra ponta, porém, o que se oferece é um sistema educacional falido, incapaz de operar uma verdadeira transformação social. O indivíduo formado em universidades ruins tem sua vida cada vez mais precarizada. Ao mesmo tempo, o país quase não tem condição de competir na era do conhecimento.
"O papel do governo Lula é uma forma de dominação que estou chamando de hegemonia às avessas. Ele capturou o movimento social e o leva a uma espécie de eutanásia, a uma condução política em sentido inteiramente contrário aos interesses dessa larga base social", afirma Oliveira.
"O acerto dessas políticas é total. Mas sabemos que não leva a lugar nenhum. É para gerir a massa que vai ficar estacionada no lugar. E os tucanos não descobriram isso. Agora estão percebendo. Serra está tentando correr atrás da gestão da população escolar", diz Arantes.
"No Brasil, temos uma ciência e tecnologia em regressão e um mundo em extrema aceleração. O país está perdendo o bonde da era do conhecimento. É preciso discutir a sério o papel das universidades e da pesquisa", diz Laymert.
Nesse jogo de cena, eles dizem que o governo finge estar investindo em tecnologia e o setor produtivo finge querer esse investimento. Mas, na verdade, não quer. Sabe-se que é muito caro e arriscado tentar desenvolver a própria tecnologia. Compensa mais comprar o produto pronto.
Assim, uma parte lamentável da crise na USP, para eles, foi o fato de ter havido pouca discussão até agora sobre a questão da tecnologia, muito embora o "gancho" fosse evidente.
Um dos decretos de Serra separou a Fapesp, órgão estadual de fomento à pesquisa, da pasta a que estão vinculadas as universidades. Outro enfatizava a pesquisa operacional -o termo foi posteriormente revogado.
"É uma gestão errática, enigmática, porque é secreta. O que se passa na cabeça do governador? A não ser quebrar patente de remédio para Aids no Ministério da Saúde, o que esse rapaz fez nos últimos 12 anos no Brasil? O que o Serra pensa sobre Brasil, América Latina, capitalismo? Ninguém sabe", afirma Arantes. (UM)